quinta-feira, 22 de novembro de 2012

CONTRIBUTO PARA A HISTÓRIA DA PARÓQUIA DE SÃO CIPRIANO DE PAÇOS DE BRANDÃO - 2



  OS NORMANDOS NA PENÍNSULA HISPÂNICA

Por: Carlos Varela
         
A nossa Paróquia de São Cipriano de Paços de Brandão, é referenciada, por alguns, como tendo sido fundada por um suposto fidalgo normando, «Fernand Blandon» (?), que teria acompanhado D. Henrique de Borgonha, quando este casou com D. Teresa, filha de Afonso VI de Leão e Castela. Intencionalmente ou talvez não, o  que nos contam  sobre os Normandos, resume-se quase a nada.

Foi fácil arranjar uma personagem, validada pelo menos por três personalidades, o sacerdote, o escritor e o político, para ser de tal maneira enfatizada, que lhe deram o ano de 1095 como entrada nesta Paróquia de Paços de Brandão, e, nem sequer quiseram ou souberam, saber da história  dos «Normandos» na Idade Média.

Julgo que se tivessem consultado qualquer manual de História Universal sobre a Idade Média, ou uma crónica que nos diz directamente respeito, estou, como é óbvio a referir-me à “CRÓNICA GERAL DE ESPANHA DE 1344”, cuja edição crítica do texto português, efectuada por Luís Filipe Lindley Cintra; e teriam mudado de opinião, os «historiadores» e «intelectuais» desta terra não quereriam ter um antepassado que se identificasse com aqueles, que, de seguida vou levar ao Vosso conhecimento. Certamente que encontrariam outro. O que era preciso, presumo eu, seria encontrar alguém, não importa quem, logo que tivesse no apelido algo idêntico a «Brandão», para que se festejasse, com pompa e circunstância, um  qualquer aniversário. 

Mas não se julgue que é só na Crónica Geral de Espanha que tal se encontra. Consulte-se, por exemplo, “HISTOIRE – DESCAPÉTIENS – Rois de France, par M. Le Comte de Ségur – Paris M.DCCC.XXIV” e verifiquem o que lá se encontra sobre os Normandos:  
«Les Rois de France regrettaieent constamment la perte d´une de leurs plus belles province, conquise sur eux par les guerriers du Nord; ils regardaient les ducs de Normandie comme des vassaux infidéles, comme des rivaux et voisins dangereux».

Agora, tirem as conclusões e digam-me, se o que vão ler é ou não um bom contributo para que se estude, com seriedade, a história desta Paróquia?...
O que vieram fazer os normandos à península?...

Consultando-se a “CRÓNICA GERAL DE ESPANHA DE 1344”, edição crítica do texto português pelo Académico Correspondente, Luís Filipe Lindley Cintra – Lisboa – 1954 (Academia Portuguesa de História), Volume II, pgs.411/412; 422/423 – Volume III, pgs.108 a 110, fica-se a saber o que vou tentar, de uma maneira muito simples, transcrever, mantendo o texto original, para melhor compreensão dos interessados por estes assuntos:
                                
 Capítulo CCLVII
VITÓRIA DE RAMIRO I SOBRE OS NORMANDOS
                                                         
Como el rei dom Ramiro venceu os Normaãos e matou todollos os altos homeens que se lhe alçarom
«Andados quatro ãnos do reynado deste reiy dom Ramiro – e foy esto na era de oitocentos e sateenta e dous annos e andava o anno da encarnaçon de Nosso Senhor Jhesu Cristo em oitocentos e viinte e quatro annos e o da Luys, emperador de Roma e rey de França, em quatorze – chegarõ ao faro de Galiza, con muytos navios, os Normaãos, que era huam gente muy crua, segundo conta a estória. E aquella gente, que assi era crua, era pagãa, que nunca ainda  tanta fora vista em Espanha toda.
Mas, contra Espanha, todallas as gentes do mundo se atrevyã a vur guerrear e entralla e assenhoreala  e fazer hy todo  o que quiserom. Pero, aacima  todos se acharom mal, ataa que se acabou ennos Godos. E desi ficou ennos naturaaes, que foron depois guaanhandoa dos outros e espargeron muyto sangue por ella, morrendo hi muytos altos homeens e de grande guisa e, doutros, muytos a maravilha, destes enmiigos da fe; ca, do mar de Sancto Andre ataa o mar de Calez, nõ lhes ficou / enton senõ muy pouco. E esto he no reynado do muy nobre rey dom Sancho, o quarto, na era de mil e trezentos e viinte e sete annos.
E, ermpos esto, veerõ cõtra aquella gente dos Normaãos. E, logo que soube el rei dom Ramiro como elles veherõ, sacou sua hoste muy grãde e foy lidar con aquellas gentes bravas; e prougue a Deus que tam de ryjo ferio en elles que se vencerõ os Normaãos, pero que eram gente áspera e forte, segundo conta a estória, e morreron hy muito deles. E assi foi ally beadante el rei dõ Ramiro que os venceu e os dasbaratou; e mãdoulhes hi logo poer fogo aa frota e queimoulhes hi sateenta naves. E, daqueles Normaãos, os que poderon scapar daquela queyma fogiron cõ alguans dessas naves pelo mar. E guaanharon hi, el rey dõ Ramiro e os cristaãos, muytos esbulhos e muytas riquezas.
E, os Normaãos saydos da terra, tornousse el rey dõ Ramiro saão e salvo e com grande presa e muy alegre, elle e toda sua hoste, pera seu logar. E aquellas naves dos Normaãos, que dalli scaparon, veherõ come de cabo sobre Sevilha e combaterõna. E, como estava a cidade quebrantada da outra gente que dissemos antes desto, nõ poderon acordar sobre si tam bem que se defendessem deles. E quebrantarom os Normaãos a villa. E morrerõ hy muitos deles. E levaron ende os Normaãos grãnde prea, segundo conta a estória, e tornaronsse per mar pera sua terra.
En quanto esto acõteceu, creceu a este rey dom Ramiro muy grãde contenda em sua terra. E foy per esta guisa: huum cõde, que avia nome Alderado, e outro conde, que chamavam Privyolo, com sete filhos seus,alçarõsse cõ sobervha e loucura contra este rey dõ Ramiro. E elle prendeuhos e sacou logo os olhos ao Alderado e mãdou escabeçar a Priviolo e aaquelles sete seus filhos.
E en este anno choveu na terra de Gasconha huan ceveira que semelhava graãos de triigo, se nom que era mais meudo ja quanto.»

                                                              Capítulo CCLXV
                             Do que fezeron os Normaãos en terra d´Espanha

«Andados nove annos do reynado deste rey dom Ordonho – e foi esto na era de oitocentos e sateenta e três annos e andava entõ o anno da encarnaçõ de Nosso Senhor Jhesu Cristo em oitocentos e trinta e seis ãnos – aportarõ em Espanha, em Aljazira, huam frota de gente de Normaãos, em que avia saseenta naves bem bastecidas e guarnidas de gente e do que avyã mester. E aquella Aljazira he emnas marismas d´Espanha em terra da Andaluzia. E sairon a terra e matarõ hy muytos mouros e queymarõ toda a terra pella costeira do mar e levarõ das mesquitas muy grandes algos que hy acharom.
E, feito ally esto, passarom a terra d´Africa e aportarom aa marisma da terra de Mauritãna e filharõ a cidade que chamava Natoze, que era dessa provencia, e matarom hy muitos mouros. E dalli forom adeante e correrõ e estragarom todallas ilhas que ham nome Mayorgas e Mynorgas, Eviça e a Frumeteira.
Depois esto, foronsse pelo mar a Grecia e correron a terra e guaanharon hi muy grande algo. E, dally, tornaronsse pera / as marismas d´Espanha; e jouveon hy e teveron hy o inverno. E, na entrada do veraão, foronsse pera sua terra.

                                                                Capítulo CCLXVI
                                                    Da morte del rei dom Ordonho
«Andados dez anos do reinado del rei dom Ordonho – e foi esto na era de oitocentos e sateenta e quatro anos – adoeceo dos pees dhuam enfermydade que dizem na física pedraga. E pedraga he palavra composta destas duas partes que dizem em grego por o que enna linguagem de castella chamam pee e outra agros, enno grego outrossi, por o que em castellaão dizem contreitura ou contreito, onde pedagra tanto quere dizer enna linguagem de Castella como enfermidade de contreitura das maãos ou contreitura dos pees. E desta enfermidade adoeceo el rei dom Ordonho. E morreo em Ovedo e enterrarõno hi muy honradamente na igreja de Sancta Maria. A sua alma reine com Deus, ca mui boõ rei foi.»

                                                                  Capítulo CCCLXIII
Como huans gentes dos Normaãos veherom a Espanha e roubarom Galliza; e de como outrosy morreu Abdenaamer, rey de Cordova.

«Conta aqui a estorya que, andados dous ãnos do reynado deste rey dom Ramiro de Leom, que Guderedo, rey dos Normaãos, cõ grande hoste, em frota de muytos navyos, arribarõ em Galiza, que he em fundo d´Espanha. E sayrõ em terra e entrarõ per ella, estragandoa e danando quanto achava, ca lhes nõ ficava as poboas meyores nem as villas mayores, que todo nõ tomarõ e destroy / rõ. E fazer grandes dampnos arredor de Santiago, que nõ acharom quem a eles saysse nem lhes fezesse aetorvo; e matarõ hy entom dom Sistiando, arcebispo de Sanctiago. E correrõ toda a terra atas o mõte que chamã Zebreyro, que nõ acharõ estorvo nem huum em essa terra. E esto durou bem huum ãno, assy como conta a estorya.
E, em esse ãno, morreu Abdenaamer, rey de Cordova, e reynou empos elle seu filho Alahatã treze ãnos e dous meses. E aquelle Alahatam chamatom per outro nome Alahazubible, que quer tanto dizer em linguagem de Castella come: «homem que se defende de Deus». E bem semelhava que aquelle rey se defendya com Deus, ca achou o reyno de Cordova muy bem  apostado e toda a terra muy em paz e muy assessegada e sem todo buliço e mantevea o filho em aquella maneira que a mãteve o padre. E esto lhe durou, segundo conta a estorya, em todo o tempo que elle reynou. E nem ouve mester de fazer batalhas nem por que husar de feito d´armas.
E, em este ãno, morreu o papa Estevõ e posserõ em seu logar Martinho, o segundo, e comprironse cõ este cento e vinte e nove apostolligos.
Mas agora leixaremos estas razões e tornemos ao feito dos Normaãos.»
                                                                
                                                                   Capítulo CCCLXIV
Como o conde dom Gonçallo Sanchez de Galiza foy lidar com os Normaãos e os venceu e desfez todo seu feito, matandoos todos, e queymou as suas naves.

«Conta a estorya que, passadas estas cousas que ditas avemos e andados três ãnos do reynado del rey dom Ramyro – e foy esto enna era de nocentos e sateenta e sete ãnos e o anno da encarnaçom de Nosso Senhor Jhesu Cristo em novecentos e dez e nove – aconteceu assi que aquella companha dos Normaãos, despois / que ouverõ corruda e roubada toda a terra e feito hy sem guysa quanto quiserõ, querendosse eles já tornar a suas naves cõ muy grandes gaãças e muytos cristãos que levava cativos pera sua terra, sayu a eles aquelle conde dom Gonçallo Sanchez, a provar se poderya deles aver alguam vingança de tanto mal como avyam feito enna terra dos cristãos.
E foy a eles muy atrevudamente, chamando o nome de Deus e do apostollo Santiago; e, assy chegou, avolveo a lide fortemente, ferindoos muy de ryjo, e lidou cõ eles. E, com a mercee de Deus e do apostollo Santiago, cuja egreja eles quebrantarõ e roubarom, venceuhos e desbaratouhos, de guisa que todos hy morrerõ com seu rey. Assi que, de muy grande gente que eles eram, nõ ficou quem arma podesse tomar contra eles nem fazerlhes nem huum dãpno, ca todos erã mortos os demais deles, como dito he; e os outros que focarõ fotõ cativos e presos e todo seu feito desbaratado e destruydo.
E, feito esto em esta guisa que dito he, aquelle conde dom Gõçallo Sãchez foi logo e queimoulhes todallas naves onde estava na ribeira do mar..»


Termino este artigo com um adágio popular tão em uso, naquela época, em Terras Galegas, sem contudo deixar expresso que os Normandos invadiram e saquearam a Galiza, por diversas vezes, desde os anos de 968 / 970 até 1111 ou 1112, em que Sigurd (1108) invade e saqueia toda a Galiza e toda a costa ocidental até Lisboa.

A Galiza foi o último território da Europa que conseguiu sacudir os normandos; só desde o século XI / XII, que o litoral atlântico se viu livre das incursões dos piratas, todavia, ainda em 1152, a Galiza vira as suas terras pisadas por um número considerável de normandos debaixo do mando do intrépido Ronald.

Enquanto tal sucedia num Reino ao qual estávamos subordinados, a nossa Paróquia de São Cipriano de Paços de Brandão, arranjava um «normando» para em 1095 dar nome a esta terra, segundo, claro, o que vem expresso nos “900 Anos de Paços de Brandão” !!!

«DEL FUROR DE LOS NORMANDOS, LIBRANOS SEÑOR»
«A FURORE NORMANORUM, LIBERA NOS DOMINE».

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